quarta-feira, 13 de julho de 2011

Médico diz que corrupção não tem cura

Médico diz que corrupção não tem cura
A cama caiu. Este é o nome da tela, pintada pelo artista Waldomiro de Deus, em 2005, quando os pilares do Congresso Nacional começaram a ruir. E se as tramóias políticas jamais fossem descobertas, a cama continuaria em pé? O psicoterapeuta e médico do Hospital das Clínicas de São Paulo João Figueiró garante que sim. “Corrupção é um desvio de caráter praticamente incurável, irreversível, que pode ser contido apenas por meio de sanções externas. Por exemplo: se você avança o sinal vermelho, é multado”, comenta o especialista.

Para infratores de trânsito, pontos na carteira. Para crianças desobedientes, fim da sobremesa. E com um político faltoso, o que se faz? “Nada se faz, geralmente. É essa impunidade que encoraja a prática da corrupção na política”, diz Figueiró. O caso Fernando Collor de Mello exemplifica com perfeição o pensamento do profissional. Alvo de um impeachment em 1992, o ex-presidente foi eleito senador na última eleição.

Para muitos, o diagnóstico da corrupção como mal crônico pode parecer cruel demais. Para outros, no entanto, a constatação de que “a ocasião faz o ladrão”, como afirma o conhecido ditado popular, pouco incomoda. “Perdemos a capacidade de espanto. Levar vantagem é visto como positivo na sociedade, é o jeitinho brasileiro”, analisa Figueiró.
Não é preciso ser político ou personagem de história infantil para ganhar fama de mentiroso. Um estudo realizado na Universidade de Massachusetts, nos Estados Unidos, pelo psicólogo Robert Feldman mostrou que as pessoas contam três mentiras a cada dez minutos de conversa.
O também americano David Smith defende que a mentira é necessária para o desenvolvimento da sociedade humana. Os polêmicos argumentos que sustentam a tese estão reunidos no livro Por que Mentimos – Os Fundamentos Biológicos e Psicológicos da Mentira, lançado no Brasil em 2005 (Editora Campus).
Smith é diretor do Instituto de Ciência Cognitiva e Psicologia Evolutiva da Universidade de New England. No Brasil, João Figueiró baliza a tese do colega citando os desmandos na política. “Algumas profissões atraem mais mentirosos e corruptos que outras. O preço de ser corrupto é a segurança de não ser flagrado, o que ocorre muito na política. O poder ajuda a corromper quem está em cima do muro, sem uma sólida formação ética. É mais fácil ser honesto quando se está em atividades fiscalizadas com rigor”, diz o brasileiro.




Incurável
O tema corrupção é instrumento de pesquisa do psicoterapeuta João Figueiró, do Hospital das Clínicas de São Paulo, desde 1970. Para ele, trata-se de um mal incurável e constituído na infância. “A fase nuclear de constituição da personalidade se dá entre cinco e oito anos”, afirma. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Se corrupção é incurável, o que se pode fazer com os corruptos? Figueiró diz que é muito complicado operar alterações de personalidade e caráter. “Isso exigiria grande esforço, seria necessário que a pessoa buscasse ajuda. Eu, em mais de 30 anos de carreira, nunca encontrei um corrupto que me procurasse porque sentia-se desconfortável e queria mudar”, diz ele. Segundo Figueiró, o corrupto, no geral, não sofre com suas atitudes, não sente remorso. “Muitos até aproveitam para construir uma imagem de malandro, de esperto e isso faz sucesso no Brasil”, diz ele. Quer dizer que “mensaleiros” e “sanguessugas” não se arrependeram nem quando flagrados? Figueiró diz que o corrupto, geralmente, é também inteligente. A pessoa sempre tentará buscar uma forma de justificar sua atitude. “É o tal do “rouba, mas faz”, diz. O comportamento transgressor está tão incorporado à cultura do brasileiro, que roubar passou a ser visto como algo banal. “Passei a me interessar pelo assunto na Copa de 70, quando o jogador Gerson apareceu em uma propaganda dizendo o seguinte: “Você também gosta de levar vantagem em tudo’. Ser malandro aparece como um valor”, afirma o pesquisador.

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